segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Prefiro este.

Num dos habituais inquéritos de verão feitos em França perguntava-se qual era o mais belo desporto do mundo. Tenho para mim que é o râguebi, porque a essência do desporto é um misto de inteligência mental e de bondade para com o outro. Há muitos anos recordo-me de um jogo que assisti na África do Sul. Foi em Pretória e estavam mais de cinquenta mil pessoas a assistir. Os adeptos estavam misturados e cada ensaio era comemorado com contenção, com um grito de alegria sentido mas sem exuberância. Não existiam assobios, nem apupos ostensivos, nem ofensas verbais. Cada decisão do árbitro era respeitada e sentia-se um silêncio nas bancadas que evocava o esforço de cada homem que estava a jogar, a sua dignidade, a sua grandeza, o adversário como um aliado. O acto de jogar era infinitamente mais rico que o de ganhar. Foi o mais belo jogo que alguma vez assisti na vida numa África do Sul assolada pela violência. A partir daí o râguebi tornou-se o "desporto", o mais belo, o que até hoje nunca foi desmentido. Em Portugal o râguebi é um desporto de elite jogado nas universidades e por meia dúzia de equipas e quase sem expressão. Ir ao campeonato do mundo é um feito imenso que o mundo desportivo e político ignora completamente. Sábado joga-se com a Nova Zelândia e o jogo não é transmitido em canal aberto na televisão na terceira prova com mais prestígio no mundo depois dos JO e do Mundial de futebol. Que vergonha, que mediocridade de pensamento, que totalitarismo de gosto.Para que serve o canal 2? Jogar com a Nova Zelândia é uma vitória, é como para quem gosta de literatura estar com Herberto ou de cinema com Resnais. É por isso que o futebol se torna uma adição, uma droga, quase uma violência. Amanhã vão ser horas e horas a falar da vitória sobre a Sérvia, vai-se falar disso como uma conquista do Portugal verdadeiro. Mas isso é curto, demasiado pequeno. A derrota, no sábado, com a Nova Zelândia, transporta a aventura, a solidão de homens que não têm medo, o Adamastor da alma, o gesto épico de um País. Prefiro este. O País fora de estrutura.

2 comentários:

Anónimo disse...

Sim, concordo ('com/cordo', que quer dizer que o meu coração está com o teu, nisto (para além de outros pontos de comunhão) : também prefiro este país fora de estrutura... o que não se amesquinha... É o que mais amo!
Abraço, CatFons

Anónimo disse...

fantastico texto!!

Parabens!!