sexta-feira, 4 de maio de 2007

Antes de Ponta Delgada

No fim do Verão a bala engoliu o pensamento. Foi em setembro e nas ilhas o mar engole o eco.O homem, de um dos mais belos livros de filosofia do sec.XIX (a), barba amarelo torrado, renunciou, fundiu o espírito no metal da pistola. O espírito indomável, ferido, leão pungente,barreira absoluta, contraditória, não suportou a matéria, a testa.De todos, no seu tempo, só Camilo o pode chamar por irmão. A vida, elemento sonoro, atravessou-se.Para Antero a vida é uma réstea, a fúria do espírito não cabe nela. A bala espera-o.Columbano, dois anos antes, adivinhou-o. A testa é o erro, vertigem de cor. Todo o drama do sec.XIX português está ali. Na testa, razão à espera de justificação.

(a) " Se pois só a perfeita virtude, a renúncia a todo o egoísmo, define completamente a liberdade, e se a liberdade é a aspiração secreta das coisas, e o fim último do universo, concluamos que a santidade é o termo de toda a evolução e que o universo não se move senão para chegar a este supremo resultado. O drama do ser termina na liberdade final pelo bem." (Tendências gerais da filosofia..)
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Retrato de Antero de Quental - Exposição de Columbano Bordalo Pinheiro, Museu de Arte Contemporânea.

2 comentários:

Anónimo disse...

bem dito, Gito!
isto -o blog- está a melhorar, em forma e substância.

nem sempre aprecio a qualidade literária dos seus textos, mas você é de um equilíbrio inatacável.

um bom exemplo.

obrigado e saudações,
f

JSM disse...

Parabéns Gito por este momento de cultura, da nossa cultura. Antero era grande até ao osso. Parece que na hora final e perante a dúvida que o eco das ondas atlânticas sempre provoca, estendeu os dedos e esclareceu - foram dois tiros!
Um abraço.