terça-feira, 1 de maio de 2007

Como é Possível?

Em casa somos 7, todos muito barulhentos: a mãe (eu) está sempre a refilar, a dar ordens, a fazer exigências, ou simplesmente a pôr as coisas em ordem; o pai é muito mais calmo e paciente, sempre com coisas pertinentes para dizer, para ensinar, e sempre pronto para conversar; os filhos, na maioria rapazes, que são três, fazem voar constantemente a bola apesar da total proibição da mesma, e quando a bola está parada voam as brigas e as discussões; as meninas, que são só duas e aparentemente mais sossegadas, têm sempre opinião sobre tudo e acabam também metidas na confusão das bolas, das brigas e das discussões. Tudo isto com o pano de fundo de um piano, de uma viola ou de um CD a tocar.

No trabalho, somos a Comunidade Terapêutica para Toxicodependentes do Vale de Acór, com muita gente a trabalhar, muito mais gente para quem há que trabalhar, muitos projectos a desenvolver, desafios constantes a aparecer e problemas sucessivos para resolver. E muito gosto em fazer tudo isto.

Entre o trabalho e a casa é um contínuo desfiar de correrias, no trânsito da cidade, entre a escola e a ginástica de um filho, entre a outra escola e a música do outro filho, entre mais uma escola e mais uma actividade de um outro filho, entre o supermercado e a casa daquele amigo, entre sempre mais alguma coisa que aparece e uma outra que desaparece.

Caos? Às vezes. Confusão? Sem dúvida, embora uns dias menos que outros.

E como é possível aguentar isto, dia após dia, e contente(s)? - também uns dias menos que outros, é verdade…

Só é possível porque há um espaço.

Um espaço que abre a porta da minha vida interior onde me é dado poder ver mais longe que o meu olhar,
poder entender o que a minha inteligência não alcança,
poder escutar para além do que oiço.
E assim aceitar com serenidade o que pode não ser sereno.

Um espaço onde descubro o que está mais além de mim mesma,
o caminho para o outro, para a vida interior do outro.

E é aqui que se aprofunda o amor.
É aqui que cresce o encontro, a relação, a comunhão.
É aqui que o Bem e o Belo são reflectidos com uma luminosidade mais pura.
É aqui que posso dar tempo à escuta da Palavra que não é dita, mas que está lá.
É aqui que posso dar lugar ao Mistério, que não entendo mas que acolho.
É aqui que se torna possível, numa crescente confiança, o abandono e a entrega.

É aqui, no Silêncio.

E só porque há Silêncio é possível não me perder no ruído.
Só porque há silêncio é possível não estar só, não conhecer a solidão e o vazio.
Só porque há Silêncio é possível viver na confusão.

Aqui, imersa no barulho, mas conhecendo o Silêncio.


Nota: Este texto foi escrito como resposta ao desafio lançado pela autora do livro "Um Minuto de Silêncio", após uma troca de comentários neste blogue.

2 comentários:

JSM disse...

Na primeira parte cansei-me! Na segunda parte emocionei-me! O silêncio é difícil...estive mesmo para silenciar o comentário.
Parabéns pelo texto.

Dario disse...

obrigada rita...